A Inconvencionalidade do Julgamento de Civis pela Justiça Militar da União Segundo a Jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos

Luiz Magno Pinto Bastos Junior, Rodrigo Mioto dos Santos

Resumo


A estrutura constitucional de competências instituída pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (doravante CF/88 ou Constituição) estabeleceu que compete à justiça militar da União julgar os crimes militares, sem adentrar na qualificação dos réus. Ficando a definição de crime militar a cargo da legislação infraconstitucional, tem-se que o art. 9° do Código Penal Militar (doravante CPM), instituído pelo Decreto-lei n° 1.001, de 21 de outubro de 1969, permite que o foro militar federal julgue civis. No entanto, a Convenção Americana sobre Direito Humanos (doravante Convenção) assegura, em seu art. 8, item 1, que toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, sendo que a Corte Interamericana de Direitos Humanos (doravante CorteIDH ou Corte), apenas reconhece à justiça militar frente a garantia da imparcialidade a competência para julgar militares por crimes que atentem exclusivamente contra bens ou interesses militares, o que cria uma evidente contrariedade com a possibilidade nacional de que a justiça militar da União julgue civis. Desse modo, o objetivo geral deste artigo consiste em verificar se (e em que medida) as hipóteses autorizadoras do julgamento de civis pela justiça militar da União compatibilizamse com a interpretação que a Corte Interamericana de Direitos Humanos confere ao disposto no art. 8, item 1, da Convenção, especificamente no que se refere às garantias da imparcialidade e da independência. Com esse fim, tem-se como objetivos específicos do escrito: (a) uma introdução sobre a estrutura e a competência da justiça militar no Brasil; (b) a delimitação da possibilidade de que a justiça militar da União julgue civis; (c) a verificação, por meio de precedentes, do exato sentido atribuído pela CorteIDH às garantias da imparcialidade e da independência, previstas no art. 8°, item 1, da Convenção, especificamente no que se refere à competência de tribunais militares; e, por fim, (d) a proposição de alterações que poderiam ser feitas na legislação brasileira, ou medidas que possam ser tomadas por juízes, a fim de adequar a regulação da matéria à jurisprudência da Corte. A fim de cumprir os objetivos de pesquisa, será adotado o método indutivo tendo em vista que o sentido da imparcialidade e da independência na Convenção, bem como dos limites do foro militar, serão extraídos a partir de análises de decisões da CorteIDH.

Palavras-chave


Competência da justiça militar para julgar civis, Imparcialidade, Independência, Corte interamericana de direitos humanos, Controle de convencionalidade

Texto completo:

PDF

Referências


ALBANESE, Susana [2008] (coord.). El control de convencionalidad. Buenos Aires: Ediar, 2008.

ALCALÁ, Humberto Nogueira. El debido proceso en la Constitución y el sistema interamericano: doctrina y jurisprudencia. 2. ed. Santiago: Librotecnia, 2012.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Primeira Turma. HC 121.189/PR. Relator Min. Rosa Weber. Relator p/ acórdão Min. Roberto Barroso. DJ-e 186 de 24.09.2014.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Segunda Turma. HC 116.124/SP. Relator Min. Gilmar Mendes. DJ-e 171 de 30.08.2013.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Segunda Turma. HC. 110.185. Relator Min. Celso de Mello. DJ-e 213 de 29.10.2014.

CONTRERAS V, Pablo. Independencia e Imparcialidad en Sistemas de Justicia Militar: Estándares Internacionales Comparados. Estudios constitucionales [online]. 2011, vol.9, n.2, pp. 191-248.

GALVIS, Maria Clara; SALAZAR, Katya [2007]. La jurisprudencia internacional y el procesamiento de violaciones de derechos humanos por tribunales nacionales. Washington D.C., jan. 2007. Disponível em: http://www.dplf.org/uploads/1191599742.pdf. Acesso em 25 set. 2010.

GOZAÍNI, Osvaldo Alfredo. El debido proceso. Santa Fe: Rubinzal-Culzoni Editores, 2004.

FERRER MAC-GREGOR, Eduardo. Eficacia de la sentencia interamericana y la cosa juzgada internacional: vinculación directa hacia las partes (res judicata) e indirecta hacia los Estados Parte de la Convención Americana (res interpretata) (sobre el descumprimiento del Caso Gelman vs. Uruguay). Estudios Constitucionales, a. 11, n. 2, p. 641-694, 2013.

FLEMING, Abel; VINALS, Pablo López. Garantías del imputado. Santa Fe: Rubinzal-Culzoni Editores, 2007.

HITTERS, Juan Carlos. ¿Son vinculantes los pronunciamientos de la Comisión y de la Corte Interamericana de Derechos Humanos? (control de constitucionalidad y convencionalidad). Revista Iberoamericana de Derecho Procesal Constitucional, n. 10, p. 131-156, jul./dez. 2008. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/tablas/r25295.pdf. Acesso em: 30 jul. 2015.

LONDOÑO LÁZARO, Maria Carmelina. El principio de legalidad y el control de convencionalidad de las leyes: confluencias y perspectivas en el pensamiento de la Corte Interamericana de Derechos Humanos. Boletín Mexicano de Derecho Comparado, ano LXIII, n. 128, p. 761-814, maio/ago. 2010. Disponível em: http://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=3212723. Acesso em 20 mar. 2013.

LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual penal. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

LUCCHETTI, Alberto J. [2008]. Los jueces y algunos caminos del control de convencionalidad. In: ALBANESE, Susana (org.). El control de convencionalidad. Buenos Aires: Ediar, 2008. p. 131-162.

MAZZUOLI, Valério de Oliveira [2009]. O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2012.

ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Corte Interamericana de Direitos Humanos. Caso Castillo Petruzzi e outros Vs. Peru. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 30 de mayo de 1999. Serie C No. 52. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_52_esp.pdf. Acesso em 15 jun. 2015.

______. Caso Cantoral Benavides Vs. Peru. Fondo. Sentencia de 18 de agosto de 2000.

Serie C No. 69. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_69_esp.pdf. Acesso em 15 jun. 2015.

______. Caso Lori Berenson Mejía Vs. Peru. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 25 de noviembre de 2004. Serie C No. 119 Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_69_esp.pdf. Acesso em 15 jun. 2015.

______. Caso Palamara Iribarne Vs. Chile. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 22 de noviembre de 2005. Serie C No. 135 Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_69_esp.pdf. Acesso em 15 jun. 2015.

RAMOS, André de Carvalho. Tratados internacionais: novos espaços de atuação do Ministério Público. Boletim Científico da Escola Superior do Ministério Público da União, Brasília, ano 2, n. 7, p. 81-100, abr./jun. 2003.

REY CANTOR, Ernesto. Jurisdiccion constitucional y control de convencionalidad de las leyes. X Congreso Iberoamericano de Derecho Constitucional, Lima (Peru), 16-19 set. 2009. Disponível em: http://congreso.pucp.edu.pe/derechoconstitucional2009/docs/pdf/PONENCIASMESAS/MESA%201/REY%20CANTOR,%20Ernesto%20_Colombia_%20-%20Jurisdiccion....pdf. Acesso em 12 mar. 2013.

SAGÜES, Nestor Pedro [2010]. Obligaciones internacionales y control de convencionalidad. Estudios Constitucionales, ano 8, n. 1, p. 117-136, 2010. Disponível em: http://www.cecoch.cl/docs/pdf/revista_ano8_1_2010/articulo_4.pdf. Acesso em: 20 set. 2010.

SCHEPIS, Marcelo. La influencia de los tratados internacionales en el derecho interno. El control de convencionalidad. XXV Congreso Nacional de Derecho Procesal. Buenos Aires, 11-13 nov. 2009. Disponível em: http://www.procesal2009bsas.com.ar/ponencias-constiproceso.html. Acesso em 25 set. 2010.

VILLANOVA, Marcelo [2010]. Sobre el control de convencionalidad: a propósito de las implicancias del control en el sistema de garantías. Pensamiento Penal, 2010. Disponível em: http://www.pensamienatopenal.com.ar/01072010/doctrina04.pdf. Acesso em: 20 mar. 2013.




DOI: http://dx.doi.org/10.26668/IndexLawJournals/2526-0197/2015.v1i1.839

Apontamentos

  • Não há apontamentos.


Licença Creative Commons
Este obra está licenciado com uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial 4.0 Internacional.