JUSTIÇA AMBIENTAL NO CONTEXTO DA COVID-19: O DIREITO FUNDAMENTAL AO MÍNIMO EXISTENCIAL SOCIOAMBIENTAL

Joana D'arc Dias Martins, Maria de Fátima Ribeiro

Resumo


Embora se diga que o novo coronavírus é um vírus democrático, atingindo ricos e pobres, a realidade demonstrou que a pandemia “escolhe” como suas vítimas preferenciais as pessoas mais pobres. Nesse sentido, o objetivo deste artigo é analisar a injustiça ambiental no contexto da Covid-19, sobretudo como as violações sistemáticas dos direitos socioambientais das populações vulneráveis contribuem para a contaminação e o aumento do número de mortes entre esse grupo. Igualmente, é objetivo demonstrar que o mínimo existencial socioambiental - núcleo essencial dos direitos humanos fundamentais -, é condição para a garantia do princípio da dignidade humana, e como tal, não pode ser objeto de discricionariedade e relativizado. Logo, diante da omissão do Estado na sua implementação, esse direito pode ser reivindicado em Juízo. Por fim, conclui-se que em curto prazo o imperativo ético exige “fazer o que for necessário” para preservar vidas humanas e garantir uma vida com dignidade a todos. Contudo, em um pós-pandemia, a reconstrução econômica do país deve ser fazer em novas bases – mais sustentável, inclusivo e promotor de justiça. A metodologia utilizada nesta pesquisa, quanto aos meios, foi desenvolvida mediante o método dedutivo, descritivo e qualitativo, através da análise bibliográfica, doutrinária e jurisprudencial.


Palavras-chave


Injustiça ambiental; Covid-19; mínimo existencial socioambiental; desenvolvimento sustentável; controle judicial; políticas públicas.

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DOI: http://dx.doi.org/10.26668/IndexLawJournals/2358-1352/2023.v35i13.7356

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