O Exame Criminológico como Mecanismo de Biopolítica

Flávia Ávila Penido, Jordânia Cláudia de Oliveira Gonçalves

Resumo


O presente estudo aborda a exigência do exame criminológico como requisito à progressão de regime. Busca-se evidenciar que a referida perícia tem o condão de funcionar como um mecanismo de biopolítica do Estado, enquanto gestor da vida, fundado em uma estratégia política e de poder. Observa-se que o exame criminológico apresenta-se como uma perícia vista como capaz de prever a periculosidade do agente e, portanto, a probabilidade de reincidência. Com o escopo de proteger os interesses sociais e sem observar a alteração legislativa operada pela Lei 10.792/03, restabeleceu-se, através da súmula vinculante número 26 editada pelo Supremo Tribunal Federal em 2009, a facultatividade de requerimento do exame criminológico como um requisito à progressão de regime de forma a evitar que sentenciados que apresentem alto grau de periculosidade sejam reintegrados ao convívio social. Diante deste contexto, passa-se a defender nesta pesquisa que o restabelecimento de um requisito que dificulta o ingresso em regime de liberdade ou semiliberdade faz parte de uma estratégia geral de poder, como um mecanismo de segurança apto a gerir o bem-estar social através de critérios biológicos de seleção dos indesejáveis.

Palavras-chave


Exame criminológico, Biopoder, Biopolítica, Execução penal

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DOI: http://dx.doi.org/10.26668/IndexLawJournals/2526-0065/2015.v1i1.33

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